quinta-feira, 16 de julho de 2009

II Festival de Cinema de Paulínia - Tese e Poesia (Só Dez Por Cento É Mentira; Olhos Azuis)

Depois da excelente noite de segunda-feira, mais uma vez o festival cai na morosidade. Nada comparável ao sábado, mas se a terça-feira não ofereceu filmes tão precários, ao menos não deixou de cair na vala comum novamente.


O documentário sobre Manoel de Barros, Só Dez Por Cento É Mentira, busca retratar um pouco da vida do recluso poeta mato-grossense. Mas o que logo ofusca a curiosidade e o interesse na vida do retratado e de sua personalidade inventiva e bem-humorada é um fetichismo sem limites na construção de imagens que tentem traduzir a poesia do autor, intermediando os depoimentos com grafismos e cenas tão polidas quanto insossas, no pior estilo descanso de tela de Windows: paisagens, pedaços de ferro cuidadosamente enferrujados, crianças correndo em contraluz. Talvez o que mais chame atenção no longa dirigido por Pedro Cezar é a estrutura concedida pelo próprio poeta de biografar a sua vida através de várias “infâncias”. Os depoimentos nada acrescentam objetivamente, como o do escritor Fausto Wolff, por exemplo. Eles estão lá para exaltar, o que logicamente não deixa de ser justo, mas essa glorificação excessiva imprime a sensação de filme-homenagem, a qual não demora a empalidecer com extrema facilidade e fugir da memória (ao contrário, claro, da poesia de Manoel).


O novo filme de José Joffily, exibido logo em seguida, é aquele que mais explicitamente abraça o gênero (o do thriller policial) no Festival deste ano. Falado quase todo em inglês, Olhos Azuis gira em torno de Marshall (David Rasche, o superior de John Malkovich em Queime Depois de Ler, dos Coen), um policial que comanda o departamento de imigração do aeroporto JFK, nos Estados Unidos, se aposenta depois de um crime que ocorre em sua repartição e logo parte para o Recife para tentar se redimir. Lá ele busca, na companhia de uma prostituta (Cristina Lago), uma garota que tem relação com a vítima. Com essas duas narrativas correndo paralelamente em tempos distintos, a tentativa de emular a tensão de um William Friedkin acaba caindo por terra já na primeira meia-hora justamente porque o filme quer se fazer relevante perpassando por questões como xenofobia, racismo e culpa da maneira mais engessada possível, incluindo nos diálogos passagens como “Vocês latinos só vem aqui para tirar um pedaço do que construímos”.

Se o charme e a fluidez dos melhores policias americanos da década de 1960 e 1970, como Operação França, Bullit ou Chinatown estavam em como eles exploravam seu próprio universo (e a angústia dos personagens nele inseridos) a favor da tensão, Joffily, pelo contrário, se esquece dessa prerrogativa e passa a colocar a situação em evidência, neste caso a questão social envolvida com aqueles que podem ser expatriados, na sala de imigração, que serve apenas como decoração para uma narrativa que começa a escancarar suas engrenagens. Não é um filme que se deixa ser descoberto pelo espectador; ele quer se mostrar “grave”, “alarmante” com essa espécie de obrigação social (e moral, no que a rápida aparição do avô da garota pernambucana ilustra tão forçosamente), fazendo das atuações inicialmente tão interessantes (com destaque também para Irandhir Santos, que interpreta Nonato) meras vitrines para o cineasta expor, sem sucesso, sua tese sociológica.

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