sábado, 16 de novembro de 2013

Blue Jasmine (2013), de Woody Allen



É sempre incrível poder ter a oportunidade de presenciar uma lenda como Woody Allen lançando filmes a cada ano, alguns menos aparados que outros, mas sempre num fluxo de atividade impressionante. Parece existir aquele tipo de filme que Allen vai moldando nos intervalos entre uma produção e outra, sempre lapidando mais, polindo o roteiro com cuidado extra, refinando os diálogos. E Blue Jasmine parece uma dessas obras em que ele se debruça com carinho especial, como se a tivesse deixado maturar por um bom tempo.

Um dos motivos para seu preciosismo deve ter sido Cate Blanchett, sua escolha para musa, com uma atuação emocionalmente insana, digna de Gena Rowlands em Uma Mulher Sob Influência (1974). Claro que o filme de Cassavetes é muito diferente, mas a intensidade com que vemos Blanchett alternar entre um olhar e outro, um choro e uma sufocante crise nervosa é algo para se aplaudir em pé. Poucas atrizes atingem esse nível sem cair na caricatura, e a cada close, a cada pausa, percebemos o quanto Woody Allen molda o filme para ela – e a alternância precisa entre os tempos do filme, com uma montagem primorosa, realça o impacto dessa percepção.

Allen parece ainda mais à vontade filmando em São Francisco, e a cidade costeira parece incorporar como nunca a desorientação de sua protagonista, Jasmine (Blanchett), principalmente pelo grande choque cultural que ela experimenta. As ladeiras íngremes e a baía parecem personificar o estado psicológico da ex-socialite, sempre oscilante, falando com as paredes, enfim, à deriva. Falida, ela agora tenta reorganizar sua vida com a irmã proletária (Sally Hawkins) depois que seu marido, especulador da bolsa (Alec Baldwin), é preso por fraudes no sistema financeiro (subtexto político que o diretor retrata com sutileza, mas não menos mordacidade).

Essa complexa teia de relações (entre as irmãs – ambas adotadas, filhos, o ex-marido, os namorados, etc.) é muito bem costurada no roteiro de Allen, remetendo aos tempos de Hannah e Suas Irmãs (1986), em que os personagens, ainda que menores, não eram meras aparições especiais (nesse sentido, o dentista interpretado por Michael Stulhbarg aqui é sensacional). Ao longo de todo filme, a comicidade sempre vem acompanhada por um forte sabor amargo, ainda mais acentuado nos minutos finais.

Blue Jasmine é produto de um cineasta em grande forma, e talvez o embrião de uma parceria duradoura com uma atriz magnética, versátil e de talento absurdo. Que assim seja, para nosso deleite cinéfilo.



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