segunda-feira, 1 de junho de 2009

Quê? (Polanski)


Um dos Polanski mais obscuros, da sua fase pré Chinatown, é este Quê? (1972), uma fábula completamente nonsense estrelada por Marcello Mastroianni e Sydne Rome. Aqui, o tom de um sonho surrealista que Polanski impõe vem muito mais firme do que em O Inquilino, por exemplo. É o tipo de filme que vai fundo na construção de um universo muito próprio, teatral, e seria muito difícil não imaginar os Coen se deliciando com esse tipo de material (como, aliás, já disse aqui a respeito de Armadilha do Destino, que deve estar na cabeceira dos irmãos).

Rome faz uma viajante que foge de uma tentativa de estupro numa carona com três estranhos, um deles estrábico e que origina uma das melhores piadas do filme. Ela então se vê numa bizarra mansão à beira-mar, onde posteriormente vai conhecer Marcello Mastroianni, que vive um cafetão no que talvez seja uma de suas atuações mais impagáveis (e, porque não dizer, corajosa). É um trabalho que transita numa linha muito perigosa entre a canastrice e a pura caricatura, o que o italiano administra muito bem nessa loucura toda que é o filme. Rome, americana, carrega um diário onde escreve suas impressões em italiano, e permanece seminua praticamente o filme todo. Déjà vu, barões, Mozart, fantasias com peles de tigre, metalinguagem e um uniforme de Napoleão povoam o filme numa miscelânea tanto absurda quanto interessante - e, vale dizer, dirigido com plena segurança por Polanski, que também faz uma ponta com um das figuras bem peculiares que habitam essa villa que mais parece um bordel.

Quê? possui uma sexualidade pujante, não apenas pela caracterização dos personagens, mas pelo fato do filme representar, no fim das contas, uma suntuosa materialização de um sonho erótico, paradisíaco, o que a fotografia do filme, talvez a mais "ensolarada" da obra de Polanski, vem confirmar. É, de fato, um longa de ritmo bastante irregular, que parece se resolver bem melhor internamente, dentro de suas sequências que remetem a esquetes de tom farsesco (a cena da refeição "em família", ou do strip "parcial" no quarto de Noblart), do que como conjunto. Contudo, exatamente por essa irreguaridade é que o filme se torna apaixonante, na medida em que em nenhum momento dá sinal de que pretende se apoiar em alguma amarra narrativa. O polonês torrou com muita propriedade o dinheiro do grande produtor Carlo Ponti.

Um comentário:

  1. Um dos poucos do polaco q eu ainda não vi. Tem estilo que pode ser daqueles filmes de um grande diretor que "só eu vou considerar um grande filme", sejá lá o q isso signifique. hehe

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